Liberado cultivo de macroalga comercial em SC
Autorização é válida para a espécie Kappaphycus alvarezii
04 de fevereiro de 2020
A recente liberação do governo federal para o cultivo comercial de macroalgas em Santa Catarina, no dia 24 de janeiro, animou os maricultores locais. A autorização fornecida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) deve dar início a uma nova cadeia produtiva no Estado.
O secretário de Estado da Agricultura, da Pesca e do Desenvolvimento Rural, Ricardo de Gouvêa comemorou a Instrução Normativa. "Mais uma boa notícia para o agronegócio catarinense. Ao longo de 2019 fizemos várias tratativas com o Instituto do Meio Ambiente, Ministério da Agricultura, Secretaria de Aquicultura e Pesca e Ibama para a liberação do cultivo de macroalgas em Santa Catarina e hoje colhemos os resultados. Os maricultores catarinenses terão mais uma alternativa de renda".
As macroalgas são algas que vivem no mar, e são praticamente produzidas no mundo inteiro. Além das macroalgas, também existem as microalgas unicelulares que servem de alimentos à organismos filtradores, por exemplo ostras, mexilhões e vieiras.
A autorização é válida para a espécie Kappaphycus alvareziiI e a notícia já está gerando muitas expectativas entre produtores locais, primeiro porque a espécie é altamente utilizada pela indústria com uma infinidade de aplicação, conforme explicou o pesquisador do Centro de Desenvolvimento em Aquicultura e Pesca (Epagri/Cedap), Alex Alves dos Santos. “Mais de cinquenta países produzem essa alga para extração da carragenana que é um colóide, tipo uma gelatina que é extraída da alga, como é extraído o ágar. A carragenana é utilizada pela indústria química, farmacêutica, têxtil e a alga como um todo é usada também na gastronomia para ornamentação de pratos na alimentação humana” falou.
Segundo ele, a nova cadeia produtiva é bastante promissora, já que atualmente o Brasil estaria importando U$ 12 milhões, cerca de R$ 51.3 milhões só em carragenana. Os principais importadores são grandes empresas como a BRF, que utiliza principalmente as propriedades estabilizantes e emulsificantes do extrato, fundamentais para embutidos na produção de linguiças, salsichas, salames e etc. “Todas essas substâncias levam carragenana, e também os iogurtes de uma forma geral. Assim como cosméticos, cremes, molhos e mais uma infinidade de aplicações”, explicou.
Outro fator determinante é que o cultivo da Kappaphycus alvarezii pode ser combinado com a criação de ostras, mexilhões e vieiras. Ponto favorável já que Santa Catarina é o maior produtor de moluscos do Brasil. São 565 maricultores distribuídos em 11 municípios e gerando cerca de 2 mil empregos diretos. Em 2017, a produção girou em torno de 13,7 mil toneladas de mexilhões, ostras e vieiras.
Mas embora a publicação da Normativa já autorize o início da comercialização, Santos também explica que a implantação total da macroalga catarinense no mercado nacional deverá demorar mais alguns anos, pois os produtores terão que ser treinados e a tecnologia de cultivo deverá ser ensinada, assim como o próprio monitoramento. “Eu diria que vamos levar aí uns cinco anos pra que essa cadeia toda esteja já estruturada”.
De acordo com ele, as etapas para a comercialização passam primeiro pelo licenciamento ambiental, já que hoje em dia as fazendas marinhas do Estado têm licença ambiental apenas para cultivo de moluscos bivalvalves. “Eles [maricultor] vão ter que solicitar o cultivo de algas também, seguindo ali, o que está previsto na instrução normativa”.
O monitoramento dessas algas do cultivo é outro ponto fundamental que deverá ser feito pelo próprio produtor. “Durante o cultivo, os produtores terão que monitorar e mostrar que essa alga não está fugindo para natureza, ou se fixando nos costões”.
Uma década de luta
O pesquisador sublinha que a Epagri, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e os próprios produtores locais estão na luta pela liberação comercial do cultivo da alga há dez anos. Conforme ele, o cultivo experimental na água foi conduzido pelas instituições em parceria que começou no ano de 2006, quando foi solicitado ao Ibama a autorização para a pesquisa da alga. E o aval só veio em 2008 para implantar os cultivos experimentais.
“Em 2010, nós já tínhamos dados suficientes que comprovam a segurança ambiental do cultivo dessa alga. Então, a gente mandou um relatório ao Ibama pedindo a liberação dos cultivos comerciais”, falou Santos. O que só aconteceu anos após o estudo ser ampliado para outros municípios do Estado e a comprovação de que a alga não iria se instalar no meio ambiente.
“O Ibama negava [os pedidos de liberação] e mandava a gente continuar esses estudos, mas argumentamos que não havia mais nada a estudar porque já tínhamos comprovado a segurança ambiental. O Ibama tinha medo que essa alga se instalasse no meio ambiente e nós provamos que essa alga não se instalaria”, lembrou.
O pesquisador explica que a Kappaphycus alvareziiI já está há mais duas décadas e, até já foi cultivada nos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo sem que houvesse uma evidência de danos ao meio ambiente. “Em Santa Catarina será muito menos provável, ainda porque essa alga é de água quente e as águas frias do Sul do Brasil não vão permitir que ela se propague”, sublinhou.
Conforme Santos, um dos motivos do negócio não ter dado certo nos Estados é que as instaladas contrataram pescadores para conduzir o cultivo. “Não foi bem porque chegava na época de temporada, por exemplo no Rio de Janeiro, os pescadores preferiam trabalhar com turistas - o que dá muito mais dinheiro do que cultivar algas”, informou.
Outra baixa foi a falta de tradição de cultivo aquático. “Eles também não tem tradição de cultivar o mar, mas sim de extrair do mar”, falou o pesquisador, que está bem mais confiante em relação à Santa Catarina. “Aqui existe em torno de 600 fazendas marinhas já implantadas. Nós temos aproximadamente 500 famílias cultivando ostras e mexilhões há muitos anos. E esses maricultores vão ter a possibilidade de integrar o cultivo de algas ao cultivo de mexilhão. Ou seja, eles vão cultivar junto. Então, a certeza de sucesso aqui é muito grande”.
As estruturas para o cultivo das macroalgas poderão ser adaptadas às já existentes para mariscos, ostras e mexilhões. E ele garante que pequenas modificações nos longlines vão permitir a criação conjunta numa mesma estrutura. Em relação aos insumos, Santos considera que praticamente todos os produtores já tenham 80% do necessário. O básico, além dos longlines, são as mudas de algas e redes tubulares.
Apesar da empolgação, Santos afirma que o ano de 2020 será de aprendizagem para então, conseguirem estruturar a cadeia produtiva da macroalga ao fazer o cultivo sair de uma situação experimental, em que se encontra, para uma situação comercial. “O ano será de muito aprendizado, nós técnicos também vamos trabalhar com uma com legislação nova e teremos que aprender. Iremos criar um caminho administrativo dentro do próprio Ibama ou do órgão ambiental Estadual, que vai fazer esse licenciamento ambiental. Então, muita coisa ainda está para acontecer”, finalizou.
Créditos da imagem: Flickr
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